Considerações sobre o Outono
É um período que, do ponto de vista simbólico, associo ao tempo de fazer balanço. Sendo o Inverno uma espécie de coma da Natureza, é no Outono que os efeitos da avassaladora sensualidade da Primavera e os excessos do tórrido Estio devem ser pesados, avaliados e sintetizados.
É uma espécie de Idade Dourada do ano, e não é por acaso que as cores outonais são, neste nosso hemisfério, ouro e cobre, tons de paleta de uma decadência consciente, art nouveau, propícios à meditação interior.
Vivemos, todos, um tempo, caracterizado pela mais incrível das velocidades, em que não só a síntese da nossa contemporaneidade se torna quase impossível, como a possibilidade de nos fecharmos em nós mesmos e de nos vermos tal qual somos é remotíssima.
O Outono é uma espécie de instrumento, uma antecâmara-oportunidade à nossa ordem na cadeia cronológica, que os “Deuses” colocaram à nossa humana disposição para que entremos na névoa íntima e densa da nossa própria consciência e nos deixemos levar numa espiral de reflexão, que nos prepara para a quase morte invernal e nos cria condições para um renascer purificado e enérgico na Primavera que se segue.
Arranjarmos tempo, mesmo que tenhamos que lutar arduamente com esse mesmo tempo, para nos reposicionarmos perante nós próximos e perante os outros é uma necessidade vital.
Meditarmos sobre o que efectivamente somos, sobre o que queremos que os outros achem de nós e – sobretudo – sobre o que queremos ser, não é um luxo, mas sim uma condição sine qua non para que possamos viver em verdade e em paz.
Não há paz sem verdade nem verdade sem paz.
Encontrando o concreto aproximado do nosso eu, aferidas com rigor todas as nossas fraquezas e forças, as nossas qualidades e defeitos, as nossas mínguas e os nossos excessos, as nossas feridas e a nossa capacidade cicatrização, definido com clareza o possível para as nossas circunstâncias, somos então capazes de olhar para a Vida de frente e caminharmos. Às vezes, muitas vezes, demasiadas vezes sem sabermos bem qual o nosso papel nela. Mas caminhando.
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