quarta-feira, março 29, 2006

Ouvi dizer que...

Ouvi dizer que o Novo Código Penal incluiria medidas especiais para os detentores de cargos políticos, no sentido de fazer substituir as penas por crimes puníveis até 3 anos pela demissão compulsiva dos cargos.
Enquanto detentor de um cargo político considero tal facto um disparate e susceptível para contribuir para uma ainda maior descredibilização da política e dos seus agentes.
Considero, aliás, que os cidadãos nessas circunstâncias deveriam ter penalizações agravadas, atendendo precisamente à natureza das suas funções de carácter público.

Para quando...


Para quando...
- a obrigatoriedade de apresentação anual da Declaração de Rendimentos por parte dos Dirigentes da Administração Pública, Central e Local - Directores de Serviço, Directores de Departamento e Chefes de Divisão - junto do Tribunal Constitucional, como acontece com os detentores de cargos políticos?
- a obrigatoriedade de apresentação anual da Declaração de Interesses por parte dos Dirigentes da Administração Pública, Central e Local - Directores de Serviço, Directores de Departamento e Chefes de Divisão - junto do Tribunal Constitucional, como acontece com os detentores de cargos políticos?

...para quando?

terça-feira, março 28, 2006

sábado, março 25, 2006

A Nação valente e imortal...


É evidente para todos que Portugal e nós os Portugueses sobrevivemos num quadro, que em termos clínicos, se pode classificar de depressão profunda.

Na verdade, a “Nação valente e imortal” acovardou-se e vai morrendo sem o saber, num envenenamento lento mas destruidor.

O Estado que temos – e o Estado é a expressão jurídica e administrativa da Nação – é fraco, impotente, incompetente e esbanjador, porque não pode, atendendo às circunstâncias históricas da Nação, ser diferente.

Este quadro clínico traduz um status quo que se arrasta, pelo menos, desdo o tempo do Senhor D. João II, que não alterou na Idade Moderna nem na contemporaneidade. Este status quo é uma estranha e resistentíssima virose que sobreviveu à queda da monarquia, à 1ª República, ao Estado Novo e ao advento da “Democracia”.

A única diferença, que é curiosamente aquela que nos acentua os sintomas depressivos, prende-se com a natureza dos tempos e ao desenvolviemnto científico e tecnológico, que nos faz ter uma noção muito clara de outras realidades bem diversas da nossa, proporcionando-nos assim uma dolorosa comparação “on line”.

Pode afirmar-se, e com muita razão, que comparativamente há muitos e muitos países que estão bem piores do que nós. É verdade tal facto, mas que pouco adianta ou conforta a “Nação valente e imortal”.

Quase podemos afirmar, olhando para implacabilidade da História e dos seus fluxos, que estranho, estranho é ainda subsistirmos. Claro que a nossa existência soberana é uma mentira, uma mentira que a língua portuguesa e a não existência de comunidades culturalmente distintas no seio do território nacional, ajudam a camuflar.

O nosso grau de dependência internacional, a pobreza dos nossos recursos naturais com vocação energética e dos nossos recursos humanos é tamanha que, na verdade, faz de nós um país de pacotilha, um exercício secular de pantomima.

De pacotilha e de ignorantes. A ignorância é hoje o mais sólidos dos paradigmas vigentes. O povo e as suas elites são, regra geral, ignorantes, ou seja os ignorantes governados são governados por ignorantes.

O sistema de ensino é povoado por ignorantes irresponsáveis, à prova de qualquer pseudo-reforma, que produzem, à escala industrial, toneladas e toneladas de novos ignorantes. A universidade mais honesta em Portugal seria aquela que denominasse “Universidade Ignorante” e que ministrasse apenas uma Licenciatura: Licenciatura em Ignorância.

A maior parte delas – das Universidades, Institutos Superiores, etc. -, apesar de proporcionarem uma formação, com alguma qualidade, do ponto de vista meramente técnico – e até científico -, do ponto de vista humanista – ou seja naquilo que é fundamental para a formação integral do Homem (Portugueses incluídos) – é absolutamente incapaz.

Pegando no exemplo bem simples do “livro”, temos hoje professores, médicos, advogados, jornalistas, engenheiros, psicólogos, arquitectos, políticos, etc., etc., que nunca leram, sequer, 10 obras em toda a sua vida.

Mas será que ler livros, sobretudos bons livros, é importante e que a ausência da sua leitura tem assim efeitos tão dramáticos? Claro que sim. Claro que tem.

A “Nação valente e imortal” precisa de se auto-pontapear nos seus avoengos fundilhos. Precisa, como é comum dizer-se, “ganhar juízo”.

A “Nação valente e imortal” tem que olhar para dentro de si mesmo e ver. Vendo as suas entranhas verá o que é, mesmo que se tente a ver apenas o que quer ver.

Ver que o deficit de cidadania é real e resulta da ausência assustadora de cidadãos eficientemente formados.

O nosso maior problema, muito mais danoso do que as questões relacionadas com a economia, é um problema eminentemente cultural.

Do ponto de vista cultural, somos, quotidianamente, confrontados com a percepção que não é claro o universo – em termos da dimensão, da profundidade, dos contornos e dos conteúdos, em que o nosso País gravita neste dealbar do século XXI, e não o sendo, dificulta, em muito, a objectivação do nosso futuro colectivo enquanto comunidade coesa, mas heterogénea, culturalmente emancipada e livre, facto particularmente grave, quando todos sabemos, mas que Jean Pierre Rioux lucidamente verbalizou, que são apenas os vínculos de carácter cultural, os únicos capazes de dar sentido a uma comunidade cada vez mais volátil, e constantemente confrontada com a perda de referências tradicionais, porque deixam de ser reconhecidas ou porque deixam de fazer sentido, e com a emergência, em catadupa, de novas referências, cuja síntese, por causa da extraordinária velocidade a que as mesmas surgem, é quase impossível.

Quando falamos de “Cultura”, não nos referimos apenas às matrizes ancestrais, influenciadas e condicionadas pelo passar dos tempos e pela vivência das experiências, que formam esta espécie de certezas quase empíricas, de anseios partilhados, de comportamentos semelhantes, que são a nossa argamassa identitária.

Falamos também de estratégias e de instrumentos que possibilitam, por um lado a fixação de coordenadas culturais que definem o onde estamos, o quem somos e o que podemos alcançar, e por outro nos tornam absolutamente abertos ao aproveitamento enriquecedor de todas as sinergias que advêm do pulsar do mundo.

No fundo, quando falamos de “Cultura”, não estamos, nem mais nem menos, a falar de outra coisa que não seja de “Cidadania”.

É a “Cultura” que dá sentido à cidadania, que a torna inteligível, que optimiza as suas potencialidades, e que a transforma no mais poderoso instrumento de usufruto de uma vida, individual e colectiva, de qualidade, porque assente no “Conhecimento”. Qualidade no exercício de direitos e deveres, qualidade na percepção da missão de cada um no seio da sua comunidade, e do papel dessa mesma comunidade na interacção com as outras comunidades.

Sendo um País deficitário em cidadania, Portugal é um país naturalmente pobre, porque desperdiça os seus principais recursos, é um país incapaz de viver integralmente a liberdade que ele próprio conquistou.

Este deficit de cidadania, não é mais do que a expressão inequívoca do deficit cultural, apesar de por todos os lados, em diversos domínios – e ainda bem – verificarmos a manifestação de acontecimentos ditos culturais, o que não deixa de ser, pelo menos aparentemente, quase um paradoxo, com a agravante de tal situação nos levar ao enorme equívoco de que a evidência e a expressão da criatividade é sinónimo de interiorização cultural colectiva, do ponto de vista vivêncial. Se assim fosse, acontecimentos como a Europália, Expo 98, Capital Europeia da Cultura, só para citar os de maior dimensão, determinariam uma realidade cultural completamente distinta daquela com que, infelizmente, nos deparamos.

Perante este facto, no mínimo estranho, que se traduz na simultaneidade existencial de uma criatividade profícua, irrequieta e incontestada e de um claro deficit cultural, a única conclusão a que podemos chegar é que os mecanismos de assimilação e síntese produtiva ou não existem ou estão a falhar.

Existem inúmeras causas para esse falhanço mas, na minha opinião, a principal delas reside na própria configuração do sistema de ensino.

A “Educação” em Portugal não está apta nem equacionada para encarar a “Cultura” como a mais importante alavanca para a formação integral dos indivíduos.

Tirando uma ou outra experiência, assentes, sobretudo, na constituição de algumas comissões inter-ministerais, o divórcio entre o Ministério da Educação e o Ministério da Cultura é uma realidade incontornável.

A música, o teatro, as artes plásticas, a literatura, a protecção patrimonial, ou seja todos os conteúdos e linguagens daquilo a que se pode chamar a universalidade humana, não podem estar excluídos da formação, seja qual for o patamar etário que encaremos, nem sequer perspectivados como qualquer coisa a incluir na vivência escolar, à laia de parente pobre, a latere, e normalmente equacionados na vertente meramente lúdica.

A este propósito atentemos nas centenas e centenas de projectos educativos, que proliferam pelos estabelecimentos de ensino do País, e verifiquemos quantos deles possuem real valor cultural intrínseco, que contribuam para o crescimento mental quer da comunidade escolar em causa quer da comunidade em que a mesma está inserida. Muito poucos. Demasiado poucos.

Somos um país de escassos recursos económicos, que tem a obrigação de os afectar com rigor e eficácia, definindo claramente prioridades.

Se todos sabemos o que verdadeiramente nos faz falta não são pontes nem estradas, nem em rigor “TGVs” ou estádios de futebol, mas sim “Cidadania” plena, e a cidadania é apenas uma questão cultural, então o nosso caminho está naturalmente definido e sem outra alternativa.

É necessário que deixemos de ser e persistirmos em ser a caricatura do Povo que deveríamos e podemos ser. É necessário, absolutamente necessário pensar - agir politicamente em conformidade -, de que basta o dinheiro despendido na construção de um só destes novos estádios que serviram para o Euro 2004, para equipar todas as bibliotecas escolares do País e dar formação adequada a todos os professores nelas envolvidas. Isto não é demagogia barata mas sim a realidade numérica, nua e crua, e tão querida aos nossos economistas.

É esta a reforma que o País precisa, sob pena de todas as outras que constantemente ouvimos falar, como a reforma do sistema tributário, como a reforma da justiça, como a reforma da administração pública, como a reforma do mapa político-administrativo do País, não fazerem qualquer sentido, porque nada de concreto se fez para a reforma das mentalidades, e nós continuaremos os mesmos e nós nos reproduziremos tal e qual.

Esta reforma das mentalidades, só se faz trazendo à política e aos seus agentes, um novo sonho de matriz renascentista, que integre na praxis quotidiana, desde a reflexão ao acto, uma visão universalista do homem, e que introduza mecanismos, em todas as esferas, sobretudo na esfera escolar, que estimulem a curiosidade na redescoberta das respostas aos porquês das coisas já sabidas e na descoberta de respostas aos novos porquês, trazidos pela natureza da própria contemporaneidade.

Para isso não precisamos de ter nada que já não tenhamos intrinsecamente, apenas precisamos de pegar no que temos e fazer diferente.

Temos que introduzir no nosso quotidiano a certeza que só a nós compete e que só a nós é possível resolvermos os nossos problemas.